Objeções Contra a Doutrina da Eleição
Por Vincent Cheung. Extraído de Commentary on First Peter (2006).
Uma objeção daqueles que se opõem à doutrina bíblica da eleição é que ela incentiva a libertinagem. Isso não representa uma ameaça para a doutrina, mas nos diz algo sobre como eles pensam. Nunca ocorreu a alguns de nós que pecaríamos sem restrição, mesmo se a doutrina da eleição implicar que podemos pecar impunemente. Por que quereríamos? Uma vez convertidos pela sua graça, não amamos a Deus e desejamos obedecê-lo?
Mas isso é como se essas pessoas pensassem que se a salvação depende inteiramente da escolha soberana de Deus, então elas pecariam sem restrições. Elas parecem pensar que somente se depender inteiramente do indivíduo humano alcançar e reter a salvação por seu próprio esforço, ele então desejará viver uma vida pura e santa diante de Deus. Portanto, mesmo quando estamos nos referindo aos crentes, um amor sincero a Deus é um mito para essas pessoas. Eles falam como se nunca pudesse haver obediência sem a constante ameaça de condenação, e a certeza da salvação também é inimiga da santificação.
Da mesma forma, há algo sinistro na objeção comum: “Se Deus predeterminou tudo, então por que devo orar?”. Eu desconfio de alguém que faria essa pergunta. É assim que ele pensa? Ele sugere que, a menos que tenha um papel determinante no resultado, e que a menos que o que Deus faça seja ditado pela oração dessa pessoa, ele não encontrará razão para orar, absolutamente nenhuma.
É insuficiente para essa pessoa que Deus lhe ordenou que orasse e expressasse suas necessidades e desejos por meio de humildes petições. Sua posição é que, a menos que sua oração faça uma diferença decisiva, até o ponto de direcionar a agenda divina, ela não vê razão para pedir a Deus. Certamente este é o cúmulo da arrogância e maldade. A própria pergunta tem cheiro de rebelião e presunção.
Devemos desprezar todas essas objeções e desconfiar de todos aqueles que as levantam. Por outro lado, para aqueles de nós que têm até um pouco de reverência por Deus, a simples permissão de nos aproximar do trono da graça para que possamos nos dirigir ao Pai é em si algo pelo qual estamos ansiosos para agradecê-lo em oração, e certamente não é algo de que queremos reclamar.
Então, há a objeção que diz que se a doutrina da eleição fosse verdadeira, não haveria sentido em evangelizar. Aqueles que levantam essa objeção podem se apresentar como campeões da pregação do evangelho, mas o que eu ouço é que, a menos que sua desobediência envie as pessoas diretamente para o fogo do inferno eterno, a ordem de Deus não significa nada para eles e eles não veem razão para pregar o evangelho. Isto é, a menos que eles sejam tão importantes que as próprias almas de outras pessoas dependam delas em vez do decreto soberano de Deus, então eles achariam o evangelismo inútil. A motivação deles para pregar o evangelho repousa em quão importante eles são para a salvação de almas e não no mandamento de Deus. Com uma atitude maligna como essa, talvez fiquemos melhor se eles ficassem em casa e nos deixassem pregar o evangelho.
Tais objeções alegando que a soberania divina elimina a responsabilidade moral e torna nossas ações sem sentido não seguem logicamente da doutrina da eleição, mas vêm de mentes depravadas que estão constantemente dispostas a pecar, almas miseráveis que são motivadas apenas por um senso de presunção, e da suposição antibíblica de que a graça de Deus implica mero perdão, sem transformar as pessoas que salva.
Pedro escreve que o povo de Deus é escolhido, e eles são escolhidos para viver pela “obra santificadora do Espírito”. Deus, o Pai, emite o decreto eterno, e o Espírito Santo executa esse decreto ao trabalhar na vida e no coração daqueles a quem Deus escolheu. Ele atua poderosamente em cada indivíduo escolhido, desde o início de sua vida cristã.
É ele quem ressuscita e desperta os espíritos dos que creem. Ele os convence de seus pecados e os chama para sair da sua incredulidade e da maldade para uma vida de fé e obediência. Este chamado supera todas as resistências, não forçando a vontade humana, mas muito mais poderosamente do que isso, mudando diretamente a vontade para que ela se arrependa e creia desejosamente.
Isso corrige um mal-entendido comum em ambos os lados da questão. Aqueles que se opõem à doutrina bíblica protestam que Deus não força a vontade, e aqueles que dizem afirmar a doutrina bíblica tendem a oferecer explicações antibíblicas, incoerentes e enganosas sobre como os eleitos ainda de alguma forma vêm “livremente” sem serem forçados. Mas a resposta não é dizer que Deus nunca força a vontade, como se não ser forçado é ser livre, nem dizer que o homem vem livremente, como se não ser livre é ser forçado.
Em nosso contexto, para alguém ser forçado implica que a pessoa que está sendo forçada exibe relutância em obedecer. No entanto, isso, por sua vez, implica que Deus está chamando o indivíduo sem exercer um controle direto sobre a própria vontade da pessoa, mas Deus nunca precisa “forçar” aquilo que ele controla diretamente. O homem não é forçado não porque tem alguma liberdade, mas não é forçado porque não tem nenhuma liberdade, de modo que “forçar” nem mesmo se aplica. Ele é tão totalmente controlado pelo poder divino que qualquer relutância é ligada e desligada à vontade de Deus, de forma que não há mais nada a ser forçado.
Se uma pequena tartaruga está indo em uma direção e eu quero que ela vá na direção oposta, tenho pelo menos duas opções. Se, por algum motivo, eu desejar sentir um pouco de resistência, posso empurrar sua cabeça com o dedo para que deslize para trás. Ou posso simplesmente pegá-la e girá-la. Mas ela é muito lenta, então prossigo empurrando-a por trás. Agora ela está indo a toda velocidade e de frente para a direção que eu quero que ela vá. Eu estou forçando a tartaruga? Não, não há nenhuma força para falar porque não há resistência alguma. Mas a tartaruga está longe de ter qualquer liberdade.
Claro que esta é uma analogia sobre duas criaturas (homem e tartaruga) e, portanto, tem suas falhas desde o início. O controle de Deus sobre suas criaturas é infinitamente maior do que o controle limitado que um homem pode exercer sobre uma tartaruga. Na analogia, eu não criei a tartaruga e não sustento sua vida. Eu não controlo e não energizo nem mesmo seus menores movimentos. Embora eu possa movê-la empurrando-a ou pegando-a, ela ainda possui uma relativa liberdade em relação a mim e pode mover-se sozinha independentemente do meu controle quando deixada sozinha. Como eu, seu poder e movimento vêm de Deus.
Portanto, eu não posso representar Deus nem mesmo em analogia, mas é suficiente para mostrar que, quando não estou forçando a tartaruga contra sua direção original, eu estou na verdade exercendo um controle maior sobre ela. Isso acontece quando, em vez de empurrá-la, eu pego a tartaruga inteira e a viro. Quanto mais poder eu uso para controlá-la, menos ela é forçada; quanto mais força eu exercito, menos oportunidade ela tem de exibir qualquer resistência. Da mesma forma, Deus não força a vontade — ele exerce um controle muito maior sobre a criatura do que este. Ele muda diretamente a vontade e nenhuma resistência permanece. Sendo este o caso, a criatura dificilmente é livre em qualquer sentido significativo.
━━━━━━━━━━━━━━━
Vincent Cheung. Commentary on First Peter (2006), pp. 16–18. Tradução: Luan Tavares (14/10/2020).