De Volta para Casa: Um Sermão de Natal
Por C. H. Spurgeon
Vai para tua casa, para os teus, e anuncia-lhes o quanto o Senhor te fez, e como teve misericórdia de ti (Mc 5.19).
O caso aqui aludido é extraordinário. Pode-se contá-lo entre os fatos dignos de ser lembrados da vida de Cristo, talvez tão distinto quanto qualquer outro registrado por qualquer dos evangelistas. O pobre coitado envolvido na história, estando possuído por uma legião de espíritos maus, fora levado a uma situação pior que a loucura. Tendo feito morada entre os sepulcros, vivia no meio deles noite e dia, tomando-se o terror daqueles que passavam por ali. As autoridades haviam tentado controlá-lo. Ataram-no com grilhões e cadeias, mas nos acessos de loucura ele quebrara as cadeias e transformara os grilhões em pedaços. Também haviam sido feitas tentativas de recuperá-lo, mas homem algum conseguia domá-lo. Era pior que as feras selvagens, pois estas, pelo menos, podem ser dominadas. Sua natureza feroz não se deixava render. Representava uma calamidade para si mesmo, perambulando sobre os montes, gritando, soltando uivos terríveis, cortando-se com pedras pontiagudas e torturando o pobre corpo de maneira assustadora. Jesus Cristo chegou à localidade onde ele vivia e logo ordenou à legião de demônios que o possuía: Sai desse homem (Mc 5.8). No mesmo instante, o pobre homem ficou curado e caiu aos pés de Jesus — tomara-se um ser racional outra vez. Um homem inteligente. Isso mesmo, inteligente. Mais ainda, convertido ao Salvador. Por gratidão ao seu libertador, afirmou a este: Seguir-te-ei onde quer que fores (Lc 9.57); serei teu seguidor constante, teu servo. Permite, Senhor, que assim seja. “Não”, respondeu Jesus. “Compreendo os teus motivos, a gratidão que sentes; mas, se quiseres mesmo demonstrá-la, vai para tua casa, para os teus, e anuncia-lhes o quanto o Senhor te fez, e como teve misericórdia de ti (Mc 5.19).”
Isso nos ensina um fato muito importante: a verdadeira fé em Cristo não parte os elos do relacionamento familiar. A fé não usurpa, na vida dos homens, o lugar de honra da instituição sagrada — quase a chamaria de divina — que é o lar. Não separa pessoa alguma de sua família nem a toma estranha à própria carne, ao próprio sangue. A superstição, sim, costuma fazer isso. Uma dessas, terrível, e que ousa dizer ser cristianismo, tem apartado os homens de seu lar. O verdadeiro cristianismo jamais fez nem faria isso. Se me fosse possível, iria até um eremita em sua caverna solitária e lhe diria: “Amigo, se você é o que afirma, um verdadeiro servo do Deus vivo, e não um hipócrita, como acredito ser; se você é um verdadeiro crente em Cristo, demonstre, para quem quiser ver, o que ele tem feito em seu favor: entorne essa bilha, coma o último pedaço do seu pão, abandone esta cova lúgubre, lave o seu rosto, desate o seu cinto de cânhamo; se quer demonstrar realmente gratidão a Deus, vá para casa, para junto dos seus, e conte-lhes que grandes coisas o Senhor tem feito em sua vida. Você não consegue levantar as folhas ressequidas da floresta? Podem as bestas-feras aprender a adorar esse Deus, a quem sua gratidão deveria fazer você se dedicar a honrar? Espera converter estas pedras, despertar estes ecos e transformá-los em canção? Nada disso, volte para casa. Habite entre seus familiares e amigos, realce o seu parentesco com todos os homens, tome a se unir aos seus bons companheiros, pois esse é o caminho pregado por Cristo para se mostrar gratidão a Deus”. Percorreria depois cada mosteiro e convento, conclamando monges e freiras assim: “Venham, irmãos e irmãs, saiam daí! Se são o que pretendem ser, servos de Deus, voltem para junto de seus parentes e amigos. Chega dessa disciplina absurda. Ela não é nem nunca foi uma regra prescrita por Cristo. Vocês estão agindo de modo inteiramente contrário à maneira de viver que ele mesmo adotou em sua própria vida na terra. Retomem para casa, para sua família e seus amigos!” Às irmãs de caridade, eu convidaria: “Sejam irmãs de caridade para com as suas irmãs e seus irmãos verdadeiros. Voltem para seus parentes e amigos, cuidem de seus pais idosos, transformem suas casas em centros de amor divino. Não fiquem aí sentadas, paparicando seu orgulho e em desobediência à ordem de Cristo, que disse: Vai para tua casa, para os teus, e anuncia-lhes o quanto o Senhor te fez, e como teve misericórdia de ti.”
O amor à vida solitária e ascética, considerada por alguns uma virtude divina, nada mais é que uma enfermidade da mente. Nas épocas em que havia pouca benevolência e, por conseguinte, poucas mãos para construir hospícios, a superstição andou suprindo a falta de caridade, de modo que a homens e mulheres com problemas mentais foi concedido que realizassem suas fantasias em retiros isolados ou no ócio fácil. Young disse, em versos, com muita propriedade:
Os primeiros sintomas de uma mente salutar
são a paz no coração e o prazer de estar no lar.
Acima de tudo, meus amigos, evitemos os conceitos absurdos de virtude que são frutos de superstição e opostos à verdadeira justiça. Não abandonem o afeto natural, mas, sim, amem sempre os que estão presos a vocês pelos laços de família. E a verdadeira fé cristã não há como, de modo algum, se mostrar incoerente com a natureza pura. Não nos pode exigir, por exemplo, que nos abstenhamos de chorar quando morre um parente ou um amigo. Jesus chorou(Jo 11.35) quando da morte de Lázaro. Não nos pode negar o prazer de um sorriso quando a providência nos é propícia, pois um dia também exultou Jesus no Espírito Santo e disse: Graças te dou, ó Pai (Lc 10.21). Quanto a ser adulto e responsável, não significa dizer ao pai e à mãe “Não sou mais seu filho, sua filha”. Isso não é cristianismo, mas, sim, coisa pior até do que fariam as feras, o que nos levaria a viver à parte dos nossos familiares e melhores companheiros, a estar no meio deles como se não tivéssemos com eles nenhuma relação de parentesco ou amizade. A todos os que considerem a vida solitária equivalente a uma vida de piedade, eu digo e repito: “Isso é a maior ilusão”. Aos que julgam que indivíduos assim devem ser bons tão somente por haverem rompido seus laços de relacionamento natural, permitam-me dizer que melhores que eles são justamente as pessoas que mantêm intactos esses laços. O cristianismo faz do marido um marido melhor; da esposa, uma esposa melhor. Não me livra das minhas obrigações como filho, mas me toma um filho melhor; e meus pais, melhores pais. Em vez de debilitar meu amor pelas pessoas, renova o motivo do meu afeto. Aquele a quem amei antes como pai, hoje amo também como meu irmão e cooperador em Jesus Cristo. Aquela a quem eu amava e respeitava como minha mãe, hoje amo e respeito também como minha irmã na aliança da graça, o que ela há de ser para sempre no porvir. Nenhum de vocês imagine sequer que o verdadeiro cristianismo tenha tido alguma vez a intenção de interferir no seio familiar. Seu intuito é consolidá-lo e construir lares que nem a própria morte consegue dividir, pois o cristianismo os prende no feixe da vida com o Senhor, seu Deus, e reúne seus participantes depois na outra margem do lago.
Vou agora revelar a razão pela qual escolhi esse texto para estudo. Pensei: “Um grande número de jovens vem sempre me ouvir pregar. Lotam os corredores da igreja. Muitos têm se convertido ao Senhor. Eis que o dia do Natal se aproxima, e muitos estão voltando para suas cidades para rever a família e os amigos. Quando chegarem aqui, hão de querer ouvir uma mensagem relacionada ao Natal. Vou lhes sugerir uma — para ser mais específico, àqueles que se converteram há menos tempo. Estarei lhes entregando uma mensagem, tirada da própria palavra de Jesus, adequada à sua estada junto a seus parentes e amigos na noite de Natal. Talvez possa não ser tão atraente quanto o conto natalino The Wreck of the Golden Mary [O naufrágio do Golden Mary], de Charles Dickens, mas é certamente da maior importância para eles. Começa assim: “Vá para casa e conte a seus parentes e amigos o que o Senhor fez por sua alma, e como ele tem tido compaixão de você”.
De minha parte, gostaria que houvesse vinte dias de Natal por ano. São raras as oportunidades para os jovens se encontrarem com seus familiares e amigos; quase nunca conseguem se reunir com todos como uma família feliz. E, embora eu não tenha ligações propriamente com o cerimonial religioso do dia, ainda assim amo o dia de Natal como instituição cristã e familiar, um dos dias mais brilhantes da Inglaterra e a maior comemoração anual do mundo. E quando o arado repousa em seu sulco, o alarido silencia, o patrão e o trabalhador saem para se refrescar no gramado verdejante da alegre terra. Se houver patrões aqui presentes peço que me perdoem a digressão quando lhes peço, com todo o respeito, que paguem a seus empregados pelo feriado do dia de Natal o mesmo salário que pagariam se estivessem trabalhando. Estou certo de que essa atitude alegrará em muito o lar deles. Seria injusto da parte de vocês fazer que o festejem em jejum. E justo que se lhes deem meios com que festejar e se alegrar nesse dia de tanto júbilo.
Passemos então ao nosso tema. Estamos voltando para casa a fim de rever os amigos e eis a história que alguns de nós têm para contar: Vai para tua casa, para os teus, e anuncia-lhes o quanto o Senhor te fez, e como teve misericórdia de ti. Primeiro, aqui está o que devem dizer. Depois, o motivo pelo qual devem dizê-lo. Por último, como dizê-lo.
I. Comecemos, portanto, por AQUILO QUE DEVEM DIZER. Deve ser o relato de uma experiência pessoal. Vai para tua casa, para os teus, e anuncia-lhes o quanto o Senhor te fez, e como teve misericórdia de ti. Você não deve retornar para casa e pouse a pregar de imediato. Não é isso que lhe foi ordenado. Não pegue assuntos doutrinários para sair discorrendo sobre eles, nem se empenhe em querer aproximar as pessoas de suas visões e sentimentos particulares. Não volte para casa, enfim, levando consigo as diversas doutrinas aprendidas nos últimos tempos para tentar transmiti-las. Não é essa a ordem que lhe é dada. Pode fazê-lo, se quiser, ninguém poderá impedi-lo. Sua missão específica ao voltar para casa, no entanto, é a de relatar não aquilo em que passou a crer, mas aquilo que tem sentido — o que veio a saber realmente por si mesmo. Em vez de se prender a coisas grandiosas sobre as quais tem lido, fale das coisas grandiosas que o Senhor tem feito por você. Não só o que você tem visto ser operado na congregação, e como grandes pecadores têm-se voltado para Deus, mas o que o Senhor tem feito por você. Esteja certo do seguinte: não existe jamais uma história mais interessante que a contada por alguém sobre si mesmo. The Rhyme of the Ancient Mariner [A balada do velho marujo], de Coleridge, deve grande parte do seu interesse ao fato de o homem que a escreveu ter sido ele mesmo um marinheiro. Na narrativa, um homem de dedos muito magros, dedos da morte, põe-se a relatar a história obscura de um barco no mar durante uma grande calmaria, quando, de repente, criaturas lodosas começam a nadar, impulsionadas pelas pernas, na água reluzente; e um convidado daquela festa de casamento acomoda-se então, silenciosamente, para ouvir o velho marujo, pois ele, por si só, já era uma história. Há sempre um grande interesse provocado por uma narrativa pessoal. O poeta Virgílio sabia desse fato e, sábio como era, faz, na Eneida, o herói, Eneias, contar sua própria história, pois logo de início ele revela: “da qual participei, grandemente, também”. Assim, se você quiser atrair o interesse dos seus amigos, conte-lhes o que sentiu. Conte que um dia você foi um pecador perdido e abandonado e que o Senhor o encontrou. Fale de como dobrou seus joelhos e derramou a alma diante de Deus, o que culminou com você dando pulos de alegria ao ouvi-lo dirigir-lhe a palavra: “Eu, eu mesmo, sou o que apago as tuas transgressões por amor de mim”. Conte a seus amigos uma história extraída da sua experiência pessoal.
Observe que seu relato precisa ser uma história sobre o dom gratuito de Deus. Não se trata de anunciar tudo quanto você fez, mas, sim, tudo quanto o Senhor lhe tem feito. O homem que insiste apenas no livre- arbítrio e no poder da criatura, ao mesmo tempo que nega a doutrina da graça, invariavelmente confunde grande parte do que ele próprio tem feito, ao narrar sua experiência. Já aquele que crê no dom gratuito e sustenta as grandes verdades primordiais do evangelho ignora isso e declara:
“Falarei do que o Senhor fez por mim. E bem verdade que orei, antes de mais nada, é preciso dizê-lo. Mas orei porque
A graça ensinou a minha alma a orar,
a graça de meus olhos se fez transbordar.
Sim, preciso contar dos problemas e provações em que Deus esteve comigo; mas confessando também que
A graça me susteve até o presente dia,
e sei que ela jamais me desampararia.
Nada diz sobre seus próprios feitos, ou propensões, ou orações, ou buscas, mas tudo isso atribui à graça do grande Deus, que olha para o pecador com amor e faz dos que se arrependem seus filhos, herdeiros da vida eterna. Vá para os seus, rapaz, e conte a história do pobre pecador que você foi. Vá para os seus, moça, abra seu diário e revele a suas amigas as muitas histórias da graça sobre você. Conte-lhes a respeito da obra poderosa da mão de Deus e de como operou em você com seu grande amor, soberano, imerecido e livre. Faça disso uma atraente história sobre o dom gratuito de Deus, a ser narrada com toda a família reunida em tomo da lareira.
O relato do homem geraseno mostrou ser, ainda, uma história de gratidão, ao anunciar aos outros: “Vou lhes contar as maravilhas que o Senhor fez por mim”. A pessoa grata está sempre plena da grandiosidade da misericórdia que Deus lhe demonstrou. Acha, sempre, que o que Deus fez em seu favor é imensamente bom, extraordinário até. Talvez quando você estiver narrando sua história, um de seus amigos retruque: “E daí?” Sua resposta será então: “Pode não ser grande coisa para você, mas para mim é. Você acha pouco arrepender-se, mas não é essa a minha impressão. Para mim, foi grandioso e precioso ser levado a me descobrir ser um pecador e confessar esse fato. Você acha pouco eu ter encontrado um Salvador?” Encare seu interlocutor e diga: “Se você também o tivesse encontrado, não menosprezaria minha experiência. Em sua opinião, pode não ser grande coisa que haja sido retirado tal fardo das minhas costas; mas, se você tivesse sofrido o que sofri por carregá-lo, sentido seu peso como senti durante muitos e longos anos, não haveria de considerar ser tão pouco eu ter ganhado tamanho resgate e libertação, ao olhar para a cruz”. Afirme a todos os seus amigos e parentes que viveu uma história extraordinária, sim, e se eles não conseguirem enxergar-lhe a grandiosidade, lamente por eles. Tudo você lhes deve contar com a maior sinceridade. E esperemos que sejam levados a compreender, pelo menos, que você se acha muito grato a Deus, embora possam não experimentar a mesma coisa. Possa Deus lhe conceder que você lhes narre uma história cheia de gratidão. Nenhuma história vale a pena ser ouvida mais que uma história de gratidão.
Por fim, e aproveitando o ensejo, deve ser uma história contada por um pecador que sente não merecer o que recebeu…. o quanto o Senhor te fez, e como teve misericórdia de ti (Mc 5.19). De que não foi um gesto de mera bondade, mas, sim, de total misericórdia para com alguém que se encontrava na pior desgraça e infelicidade. Oh, tenho ouvido algumas pessoas narrarem a história da sua conversão e vida espiritual de tal modo que meu coração se vê obrigado a abominar seu relato; pois falam de seus pecados como quem se vangloria mais da grandiosidade do crime cometido. Mencionam o amor de Deus sem derramar uma única lágrima sequer de gratidão; sem dar graças por meio de um coração realmente humilde, mas, sim, como quem se exalta a si mesmo tanto quanto ou até menos do que exalta Deus. Eu contaria a história da minha conversão com o mais profundo pesar, lembrando o que costumava ser, mas, ao mesmo tempo, com enorme júbilo e gratidão, ao considerar quão pouco eu mereceria essa graça. Pregando certa vez sobre conversão e salvação, senti dentro de mim — coisa que acontece com frequência aos pregadores — que contar aquela história seria como falar com a garganta seca, uma história insípida, insípida demais para mim; de repente, porém, um pensamento me tocou a mente: “Ora, você não passa de um pobre pecador perdido e arruinado. Conte a história de uma vez, conforme a recebeu. Passe a discorrer sobre a graça de Deus de acordo com o que você crê sentir”. A partir desse momento, meus olhos se transformaram em fontes de lágrimas. Os ouvintes ali presentes, que até então tinham se limitado a balançar a cabeça concordantes, começaram a se animar e a prestar atenção de verdade. Porque agora ouviam algo que um homem sentia, algo que reconheciam como real e verdadeiro, mesmo que não compartilhassem de seus sentimentos. Contem sua história, meus ouvintes, como se fossem pecadores perdidos. Não vão para casa pensando entrar ali com ar arrogante, como quem diz: “Eis o santo que volta para junto dos pobres peca” dores a fim de lhes contar uma história”. Volte para os seus como é: um pobre pecador arrependido. Se, ao entrar, sua mãe se lembrar de como você costumava ser, é desnecessário lhe explicar que houve uma transformação — ela logo perceberá, mesmo que você só passe um único dia ao lado dela. Talvez ela lhe pergunte: “Que transformação foi essa que aconteceu com você?” Se for uma mulher piedosa, você então lhe relatará toda a história de sua conversão. Sei que você não se envergonhará se eu disser que ela passará o braço ao redor do seu pescoço e beijará você como nunca, pois é seu filho nascido duas vezes, de quem ela jamais se apartará, ainda que a morte os separe por um breve momento. Vai para tua casa, para os teus, e anuncia-lhes o quanto o Senhor te fez, e como teve misericórdia de ti.
II. Em segundo lugar, POR QUE CONTAR ESSA HISTÓRIA EM CASA? Ouço muitos da minha congregação dizerem: “Ministro, sou capaz de contar essa história a qualquer outra pessoa com maior facilidade do que para meus amigos ou parentes. E possível para mim entrar no seu gabinete e lhe contar tudo o que tenho experimentado e vivido da Palavra de Deus, mas não tão facilmente ao meu pai, ou à minha mãe, ou aos meus irmãos, minhas irmãs, meus amigos”. Tentarei argumentar, então, para convencê-lo a mudar esse comportamento, de forma que eu possa ir aos seus neste Natal e servir como testemunha e missionário em sua localidade de origem; a fim de que seja um verdadeiro pregador, embora não tendo oficialmente esse título. Amigos queridos, vocês devem narrar sua história, quando voltarem para casa, pelos seguintes motivos:
Primeiro, por causa do seu Mestre e Senhor. Sim, eu sei que você o ama. Tenho certeza disso, pois tem provas suficientes de que ele o amou. Não consegue pensar no Getsêmane, em Jesus suando sangue, no momento em que lhe feriram o lado, muito menos na coroa de espinhos e nos instantes em que o esfolaram com açoites, nem imaginar o Calvário e suas mãos e pés perfurados, sem amá”lo. Por isso, uso desse argumento forte, quando lhe digo que, por causa daquele que tanto o amou, vá para os seus e lhes conte tudo. Ou você alguma vez pensou que poderíamos receber tanta coisa maravilhosa sem termos de contar nada a respeito disso depois? As crianças, nossos filhos, se alguém lhes dá alguma coisa de bom, mal deixam passar alguns minutos para contarem a todo mundo: “Tal pessoa me deu um presente… aquela outra me fez esse ou aquele favor”. Os filhos de Deus não deveriam então fazer o mesmo, narrando como foram salvos quando rolavam velozmente para o inferno e como a misericórdia redentora os impediu de serem lançados naquela fornalha como simples gravetos? Se você ama Jesus, meu jovem, minha jovem, pergunto-lhe então: por que se recusaria a contar a história do amor de Deus por você? Seus lábios emudeceriam justamente quando sua honra está em jogo? Aquele homem que fora endemoninhado, uma vez curado, conforme nos é dito, se foi “e começou a publicar em Decápolis tudo quanto lhe fizera Jesus; e todos se admiravam”. O mesmo vale para você. Se Cristo fez tanto em seu favor, você não tem como se recusar — precisa contar a todo mundo o que lhe aconteceu. Um amigo amado, o sr. Oncken, ministro de Deus na Alemanha, compartilhou conosco, na noite da última segunda-feira, que, assim que se converteu, o primeiro impulso de sua alma recém-nascida foi fazer o bem para os outros. Mas onde o faria? A primeira ideia que lhe ocorreu foi de retomar à Alemanha. Era sua terra natal, e ele pensou justamente nessa determinação de Jesus: Vai para tua casa, para os teus. Não havia, na verdade, um único batista em toda a Alemanha, nem ninguém com quem pudesse compartilhar sua história, e a maior parte dos luteranos havia se desviado da fé de Lutero e se afastado da verdade de Deus. Mesmo assim, partiu para lá e pregou. Hoje, existem setenta ou oitenta igrejas estabelecidas no continente europeu organizadas a partir de sua pregação. O que o levou a fazer isso? Nada além do amor pelo Mestre, que tanto fizera em seu favor, poder ia forçá-lo a ir e contar a seus conterrâneos a história maravilhosa da bondade divina.
Diga-me, agora, o seguinte: seus amigos ou parentes são piedosos? Então, vá e conte tudo a eles, a fim de lhes alegrar o coração. Na noite passada, recebi uma breve carta escrita com mão trêmula por alguém que já passou da idade provecta comum do homem. Reside no condado de Essex. Seu filho se converteu ao ouvir a Palavra sendo pregada, de modo que o bom homem não podia deixar de escrever para o ministro, agradecendo a ele, mas, acima de tudo, bendizendo Deus pelo fato de seu filho ter sido regenerado. Começa dizendo: “Um velho rebelde escreve, para lhe agradecer e, acima de tudo, agradecer a Deus pelo fato de seu querido filho haver se convertido”. Guardarei a carta como um tesouro. Ela termina dizendo: “Siga em frente e que o Senhor o abençoe!” Há um outro caso, que ouvi há algum tempo, de uma moça que, convertida, foi à casa dos pais, e, quando sua mãe a viu, exclamou: “Veja só! Se me dessem Londres inteira de presente, eu não ficaria tão contente como agora — pensar que você teve de verdade sua personalidade mudada e está vivendo no temor de Deus!” Oh, se você quer fazer o coração de sua mãe saltar de alegria dentro do peito, se quer deixar jubiloso e grato seu pai; se quer fazer feliz a irmã que lhe mandou tantas cartas, as quais você lia de vez em quando contra um poste de luz, com seu cachimbo na boca, vá para casa e conte a sua mãe que os desejos dela foram todos realizados, que suas orações foram ouvidas, que você não mais fará troça dela por causa da escola dominical nem rirá mais dela pelo fato de amar o Senhor; mas passará a acompanhá-la à casa do Senhor, pois você agora também ama Deus e diz: “Seu povo será o meu povo, e seu Deus será o meu Deus (Rt 1.16), pois tenho a esperança de que um dia o seu céu seja o meu para sempre”. Que alegria se alguém que está aqui e se desviou voltasse assim para casa!
Tive o privilégio, há pouco tempo, de pregar para uma instituição maravilhosa, na recepção de mulheres que tinham levado antes uma vida devassa. Antes que desse início ao sermão, orei a Deus para que o abençoasse. No final do sermão impresso, vocês observarão que há um relato de duas pessoas que naquela ocasião foram abençoadas e restauradas. A propósito, permitam-me contar-lhes o que aconteceu certa ocasião com o sr. Vanderkist, missionário urbano que labuta a noite inteira para fazer o bem, dentro da grande obra de Deus. Dois bêbados brigavam na rua. O sr. Vanderkist se colocou entre aqueles homens para apartá-los e comentou com uma mulher, que estava parada ali perto, sobre como era terrível ver dois homens se excederem daquela maneira. Superada a confusão, a mulher o acompanhou, caminhando a seu lado por um breve trecho de rua, e pôs-se então a lhe contar uma história também de dores e de pecado — de como fora trazida para longe da casa dos pais, que ficava em Somersetshire, para aquele lugar, em detrimento eterno de sua alma. Ele a levou para a casa da família dele e passou a lhe ensinar sobre o temor e o amor de Cristo. Qual a primeira coisa que ela fez quando começou a trilhar o caminho da piedade, tendo descoberto ser Cristo o salvador dos pecadores? “Preciso ir aos meus amigos”, decidiu ela. Escreveu então para cada um deles, que foram recebê-la na estação de Bristol. Nem imaginam que encontro feliz foi aquele! O pai e a mãe haviam praticamente perdido a filha, pois nunca mais tinham ouvido falar a seu respeito. No entanto, ali estava ela, de volta, graças à instrumentalidade daquela mesma instituição onde preguei, o Albergue Feminino de Londres, e restituída ao seio da família. Ah, se houvesse alguém assim hoje aqui! Não sei; no meio de tamanha multidão, pode ser que haja. Minha irmã, você se desgarrou de sua família? Abandonou-a há muito tempo? Vai para tua casa, para os teus, eu lhe suplico, antes que seu pai vá cambaleante para o túmulo, antes que os cabelos brancos de sua mãe repousem em cima do travesseiro, branco como a neve, de um ataúde. Volte para casa, eu lhe imploro! Diga a eles que está arrependida, que teve um encontro hoje com Deus — que um ministro conclamou Vai para tua casa, para os teus, e você o ouviu. Se você o fizer, não me envergonharei de ter dito tais coisas, embora você talvez preferisse que eu não as tivesse mencionado. Porque, se eu conseguir ganhar pelo menos sua alma, bendirei o Senhor por toda a eternidade. Vai para tua casa, para os teus, e anuncia-lhes o quanto o Senhor te fez (Mc 5.19).
Você consegue imaginar a cena, quando o que fora endemoninhado, citado no texto, retoma para casa? Ele fora considerado um “louco varrido” durante muito tempo. Quando chega e bate a porta, você não imagina seus amigos e parentes comentando uns com os outros, assustados: “Oh, aqui está ele de volta!” A mãe corre e tranca todas as portas, porque regressara o filho que enlouquecera. As crianças choram de medo por terem ouvido falar de tudo o que ele fazia — que costumava se cortar com pedras e rebentar cadeias, por estar endemoninhado. Mas imagine, no entanto, a alegria de todos quando o homem de repente exclama, curado, sadio e feliz: “Mãe! Jesus Cristo me curou. Deixe-me entrar, não sou mais um louco!” Quando o pai abre a porta, o ouve dizer: “Pai! Não sou mais o que era, todos os espíritos maus se foram! Não preciso mais viver no meio de sepulcros. Quero lhes contar como um Homem glorioso operou minha libertação e realizou esse milagre — como ordenou aos demônios Tora dele’, e eles se precipitaram, nos porcos, por um lugar íngreme, até cair no mar lá embaixo! Então vim para casa, e aqui estou, são, curado e salvo!” Se houver alguém aqui, esta manhã, possuído dessa maneira pelo pecado e decidir voltar para junto dos seus, para lhes contar a história de sua libertação, creio que há de viver uma cena até certo ponto muito semelhante.
Continuando, amigos, ouço alguém de vocês dizer: “Ah, ministro, juro por Deus que gostaria de retomar para amigos e parentes piedosos! Quando vou para casa, no entanto, acabo me vendo no pior dos mundos, porque minha casa está entre aquelas que nunca conheceram o Senhor. Nunca oraram por mim nem jamais me ensinaram nada relacionado com os céus”. Bem, meu amigo, volte para os seus mesmo assim. Ainda que sejam ruins, são sua família. Isso, sem falar nos seus amigos. Algumas vezes, encontro jovens desejosos de se unirem à igreja, que dizem, quando lhes indago sobre os pais: “Oh, ministro, estou brigado com o meu pai”. Ao que respondo: “Meu jovem, você precisa se acertar com seu pai antes que eu possa ter qualquer coisa que ver com você. Se há inimizade entre você e seu pai ou entre você e sua mãe, não o receberei na igreja. Ainda que sejam muito ruins, eles são seus pais”, Volte, então, meu amigo, minha jovem, para junto deles e conte-lhes a sua história; não para que se alegrem, pois é até provável que fiquem de certo modo chateados, por lhes faltar ainda fé, mas, justamente, para a salvação da alma deles. Espero que, quando você estiver narrando tudo o que Deus fez a seu favor, que sejam levados pelo Espírito a desejar a mesma misericórdia para eles também.
Contudo, não conte sua história para seus amigos ímpios quando estiver com eles todos juntos, pois rirão de você. Converse com eles um a um, quando surgir a oportunidade de ficar a sós com cada qual. Conte então sua história, e eles, depois, o levarão a sério. Houve certa vez uma senhora muito piedosa que alugava quartos para rapazes em sua casa. Eram todos muito alegres e levianos, e ela queria falar-lhes a respeito da fé. Apresentou o assunto em determinado momento, mas foi recebida com uma risada geral de desdém na mesma hora. Então pensou: “Cometi um erro”. Na manhã seguinte, depois do café, quando estavam todos de saída, ela voltou-se para um deles e disse: “Meu rapaz, eu gostaria de conversar com você por um ou dois minutos”. Levou-o para outro cômodo e conversou com ele sobre fé. Na manhã seguinte, foi a vez de outro jovem, e mais outro no dia seguinte, e assim por diante. Agradou ao Senhor abençoar-lhe as palavras simples, quando transmitidas individualmente. Sem dúvida que, se tivesse insistido com a ideia de falar-lhes em conjunto, um daria sempre apoio ao desprezo do outro, e todos continuariam fazendo pouco caso dela. Ao buscar evangelizar uma pessoa amiga, que vocês estejam sós. Um versículo é capaz de atingir a pessoa de uma forma que um sermão inteiro talvez não o conseguisse. Você pode ser o meio usado por Deus para trazer uma pessoa a Cristo, alguém até que com frequência ouve a Palavra e só tem rido dela, mas que não resistirá à admoestação gentil de quem se dirige a ele em particular. Em um dos estados da América, havia um homem, pagão famoso por ser um grande desdenhador de Deus. Guardava ódio dos domingos, das igrejas e de todas as instituições religiosas. Os ministros não sabiam mais o que fazer por ele, por mais que se reunissem e orassem em seu favor. Diferentemente dos demais, no entanto, certo presbítero resolveu passar longo tempo em oração por aquele homem. Depois, um dia, montando resolutamente seu cavalo, desceu até a oficina de forja do outro, que era ferreiro de profissão. Deixou o cavalo do lado de fora e disse: “Vizinho, vim até aqui motivado por uma enorme preocupação com a sua alma. Oro dia e noite para que se salve”. Disse isso e logo partiu então de volta para casa. O ferreiro, por sua vez, entrou em casa depois de um minuto ou dois e comentou: “Essa é boa. O presbítero fulano desceu até aqui não para discutir nem nada, só para me dizer: ‘Carrego comigo uma enorme preocupação com sua alma. Não suporto a ideia de que você se perca’. Ora, que sujeito!”, disse ele. “Mas a verdade é que eu nem soube o que responder!” Lágrimas então começaram a rolar por suas faces. Aproximando-se da esposa, continuou: “Não consigo entender isso. Nunca dei importância à minha alma. No entanto, um cidadão, sem nenhuma relação comigo, mas de quem sempre dei muitas risadas, percorreu sete quilômetros a cavalo esta manhã só para me avisar que está preocupado com minha salvação”. Não durou muito e ele achou que realmente era hora de se preocupar com sua salvação também. Entrou em casa, fechou a porta e começou a orar. No dia seguinte, estava na casa do presbítero, contando estar preocupado com a própria salvação e pedindo-lhe que explicasse o que precisava fazer a fim de ser salvo. Oh, que o Deus eterno possa fazer uso de alguns dos que estão aqui presentes do mesmo modo, para que sejam induzidos a:
Contar aos outros em derredor
Que amado Salvador encontraram;
Apontar seu sangue redentor
Como o caminho de Deus que acharam!
III. Não desejo retê-los muito mais. Há somente um terceiro ponto, sobre o qual quero ser breve: COMO A HISTÓRIA DEVE SER CONTADA?
Em primeiro lugar, conte-a com toda a sinceridade. Não fale mais do que você sabe. Não relate a experiência de John Bunyan quando deve se ater à sua. Não diga à sua mãe que você sentiu o que só Rutherford experimentou. Não lhe exponha mais que a verdade. Conte sua experiência com honestidade, pois, às vezes, como diz um adágio, “uma única mosca no pote de unguento basta para estragá-lo todo”. Uma única declaração sua, se não for verdadeira, pode pôr a perder todo o resto. Conte sua história com toda a sinceridade.
Além disso, conte-a com grande humildade. Não tente enganar os mais idosos e experientes, que sabem muito mais. Apenas relate sua história, e com toda a humildade; não como um pregador, não do alto de um imaginário posto de autoridade, mas, sim, como um simples amigo e filho.
Também, conte-a com seriedade. Deixe as pessoas verem que você fala sério. Não discuta religião com leviandade. Se o fizer, não estará proporcionando vantagem a ninguém. Não faça trocadilhos com textos bíblicos, nem use as Escrituras como piada; se o fizer, acabará falando como um tolo sem que isso sirva de nada, podendo chegar até ao extremo da situação de dar a seus ouvintes a oportunidade de rir de você, ao rirem com você de coisas sérias e sagradas. Fale tudo com leveza, mas com muita seriedade.
Enfim, conte-a com grande devoção. Não tente contar sua história aos homens antes de relatá-la primeiro a Deus. Em casa, no dia de Natal, não permita que ninguém lhe veja o rosto antes que o Senhor o tenha visto. Levante-se pela manhã e lute com Deus. Se seus amigos e parentes não forem convertidos, lute com Deus em favor deles. Aí, sim, você encontrará facilidade na obra de lutar com eles em favor de Deus. Procure se puder, falar separadamente um a um ao contar sua história. E não tenha medo de fazê-lo. Pense apenas no bem que estará praticando. Lembre-se que aquele que salva uma alma da morte cobre uma multidão de pecados e receberá estrelas em sua coroa para todo o sempre. Procure, enfim, ser contado entre os salva-vidas de Deus junto à sua família; servir de meio para conduzir seus amados parentes e amigos a buscar e encontrar o Senhor Jesus Cristo. Então, um dia, quando vocês se reunirem no Paraíso, será um grande júbilo, uma felicidade você saber que eles estão lá porque Deus usou você de instrumento para salvá-los. Permita que a sua confiança no Espírito Santo seja completa e sincera. Não confie em si mesmo, mas não tenha nenhum receio de confiar inteiramente nele. O Espírito de Deus pode lhe dar as palavras para dizer. Pode aplicar essas palavras ao coração das pessoas, capacitando-o assim a ministrar “graça aos que a ouvem”.
Para encerrar, lançarei mão de uma rápida e, creio eu, agradável mudança na análise do texto, para sugerir outro sentido. Em breve, amigos queridos, muito em breve no caso de alguns de vocês, o Mestre dirá: “Vai para tua casa, para os teus”. Vocês sabem onde fica essa casa. Fica acima das estrelas.
Onde os nossos melhores amigos
E os nossos parentes habitam;
Onde reina Deus, o Salvador.
Você, de cabelos brancos, que já enterrou quase todos os seus amigos e parentes, é provável que diga: “Eu irei para eles, mas eles não virão para mim”. Sim, talvez muito em breve seu Mestre lhe diga: “Você já permaneceu tempo demais neste vale de lágrimas. Vá para casa, para junto dos seus amigos”. Oh, que momento feliz será então! Mas, quando formos para casa, para os nossos, no Paraíso, o que haveremos de fazer? Bem, primeiro nos dirigiremos ao bendito trono onde Jesus se assenta, tiraremos nossa coroa para depositá-la a seus pés, e depois o coroaremos Senhor sobre todas as coisas. Feito isso, qual será nossa próxima ocupação? Ora, contarmos aos benditos nos céus o que o Senhor nos tem feito e como ele tem tido compaixão de nós. Mas uma história dessas há de ser contada nos céus? Será esse um cântico de Natal dos anjos? Isso mesmo. Seu conteúdo já foi tomado público por lá muito antes — não se envergonhe de relatá-la mais uma vez. Jesus já deixou isso explicado: “E chegando a casa, reúne os amigos e vizinhos e lhes diz: Alegrai-vos comigo, porque achei a minha ovelha que se havia perdido”. Você, pobre ovelha, quando for trazida para o aprisco, não irá narrar então de que maneira o Pastor a buscou e como a encontrou? Não se sentará nos prados verde jantes dos céus para relatar a história da sua redenção? Não falará com seus irmãos e irmãs como Deus amou e levou você para lá? Talvez você observe: “Mas será uma história muito curta”. Sim, seria se tivesse de escrevê-la agora. Um livro pequeno bastaria para conter toda a sua biografia. Lá em cima, no entanto, quando sua memória estiver ampliada, quando sua paixão estiver purificada, e sua compreensão, esclarecida, você descobrirá que aquilo que não passava de um panfleto na terra transformou-se em um enorme volume nos céus. Lá em cima, você contará uma longa história da graça sustentadora, irresistível, constrangedora. Creio que, quando você fizer uma pausa para permitir que outra pessoa também conte sua história, e então mais outra, e mais outra, passados mil anos no céu, você então se adiantará e exclamará: “Ó santos, tem mais uma coisa que eu gostaria de dizer!” Depois cada qual retomará sua história, até que de novo você os interrompa: “Ó amados, pensei em outro caso ocorrido comigo da misericórdia libertadora de Deus!” E assim prosseguirá, fornecendo-lhes temas para cânticos, revelando para eles material que sirva de base e conteúdo para os sonetos celestiais.
Vai para tua casa, ele em breve lhe ordenará; vai para tua casa, para os teus, e anuncia-lhes o quanto o Senhor te fez, e como teve misericórdia de ti. Só espere mais um pouco, permaneça deleitando-se nele e servindo-o, e logo você será arrebanhado para a terra da vida futura, o lar dos benditos, onde a felicidade infinita lhe tocará como sua devida porção. Que Deus lhe conceda toda a sua bênção, por amor do seu santo nome!
SPURGEON, Charles H. Milagres e Parábolas de Nosso Senhor: A Obra e o Ensino de Jesus em 173 Sermões Selecionados. São Paulo: Ed. Hagnos (2016), pp. 668–676.